quarta-feira, abril 09, 2014

A problemática de seguir o chefe

Um destes dias, saí da fábrica logo a seguir à minha superior hierárquica. E tal como ela, em vez de ir pela Nacional, decidi-me a ir pela Auto-Estrada. Normalmente vou pela Estrada Nacional, para poupar o 1€ de portagem da SCUT, mas como naquele dia não estava com grande paciência para o trânsito da estrada, fui pela via mais rápida.

Entrando na auto-estrada, deparo-me com um dos mais velhos dilemas que assolam as relações patrão-empregado: a minha chefe conduz de forma mais lenta que eu, por isso devo ou não devo ultrapassá-la?

Convém aqui dizer um pequeno aparte, para explicar que a empresa onde laboro tem muito bom ambiente de trabalho. Toda a gente se entende bem, e isso inclui as relações entre chefias superiores e intermédias. Mas isso não quer dizer que não devemos estar atentos às pequenas situações do dia-a-dia, que por serem mal entendidas podem facilmente levar a situações mais chatas. Uma graça (o chamado bitaite) que temos com um colega de trabalho do mesmo nível, pode não ser necessariamente entendida como tal por um superior, habituado talvez a outro tipo de trato. É a tal da inteligência emocional em pleno: saber lidar com toda a gente não quer dizer lidar com toda a gente da mesma forma.

Voltemos à estrada. Passam-me as várias hipóteses pelo pensamento:

- Se não ultrapasso, arrisco-me a demorar quase tanto pela auto-estrada como se fosse pela Nacional. Não é que ela conduza muito devagar, mas também não é uma Michelle Mouton.

- Se ultrapasso, posso ser visto como um “acelera”, um desmiolado sem amor à vida, que se comporta na estrada como se fosse o rei de Sealand(*), com as óbvias implicações profissionais. É que muitas vezes mudamos de comportamento quando saímos porta fora da empresa, para assumir uma postura mais relaxada, mais “caseira”, ou até mais louca, até ao momento em que nos aparece um colega ou chefe pela frente, e ficamos sem saber como nos comportar.

Ok, decido-me a ultrapassar. 

E agora? Ultrapasso sozinho? Ou aguardo para que passem outros carros, para ir junto e assim, talvez, passar despercebido?

Decidi-me pela 2ª opção. Aguardei uns segundos para que passassem outras viaturas, inseri-me na fila e lá fui à minha vida. Assim, pelo menos, não pareço um acelera isolado, sou mais um na manada. 

Mas isso fez-me pensar noutras situações similares: e se encontrasse um chefe numa casa de banho pública? E se andasse aos encontrões num concerto de música, para tentar chegar à frente, e de repente reparasse que a pessoa a quem estava a passar por cima era um superior hierárquico? E se a pessoa que também estivesse a olhar para o último Kinder da prateleira do supermercado fosse o chefe??? Bom, aí podia bem ficar com ele, não vou daqui à esquina para comer doces... E ainda bem que a Ryanair já tem lugares marcados, senão era chato ir a correr com o chefe, pela pista do aeroporto, para arranjar os melhores lugares. E aí, ultrapassava ou deixava-me ficar?...


(*) Para quem não sabe, o “principado de Sealand” é uma zona auto-proclamada como tal, ao largo da costa britânica (Sudeste). O senhor Paddy Bates ocupou, em 1967, uma pequena instalação naval inglesa, abandonada após a 2ª guerra, e proclamou a independência da zona. Como, na prática, esta ficava fora da zona de jurisdição da justiça britânica, ninguém o chateou muito. Tem uma população de 50 habitantes, hino, moeda própria, e até uma equipa de futebol. Só não sobra ninguém para assistir aos jogos. Mas após a morte do “Rei Bates”, o filho não lhe seguiu as pisadas, e o território está actualmente à venda.